sexta-feira, 15 de janeiro de 2010

A Dupla Vida de Véronique - Krzysztof Kieslowski

O primeiro filme da fase francesa da carreira de Krzysztof Kieslowski, retrata a estória de duas mulheres: Weronika e Véronique. Ambas têm aparências idênticas e nasceram no mesmo dia, mas moram em países diferentes e nunca se encontraram. Elas têm uma estranha ligação que será mais bem entendida no decorrer do filme, mas não totalmente explicada.

A primeira estória a ser contada é a de Weronika. Uma mulher que ama cantar, tem um jeito quase infantil, toca piano e sofre de uma doença do coração (mas não sabe disso).

“Tenho uma sensação estranha, uma impressão de não esta só” – Diz Weronika para seu pai, numa hora do filme em que tomamos conhecimento da forte influencia que Véronique tem sobre a outra e vice-versa. As duas se encontram num breve momento, se vêem de relance, mas não podem ter a certeza de que viram, realmente, uma figura gêmea.

Weronika é selecionada para cantar em um concerto e, durante a apresentação oficial, sofre um ataque cardíaco e morre cantando.

A partir daí é contada a estória de Véronique. Ela é mostrada desolada pela morte de Weronika, mesmo sem saber de sua existência. Diz que, de repente, se sentiu muito só. Ela decide romper (inconscientemente) com coisas que a ligavam à Weronika, como um exemplo, a aula de piano.

Ela também sofre do coração, mas consegue ir a um cardiologista a tempo.

Véronique dá aulas de música. Um dia, vai à sua escola um homem que vive de fazer espetáculos com bonecos e escrever livros infantis. No espetáculo que ele apresenta, há uma bailarina que quer dançar, mas quebra seu tornozelo. Ela morre e vira uma borboleta (numa linda cena). A protagonista fica encantada com o homem e desenvolve uma espécie de paixão platônica. Ela mal sabe que o tal homem, chamado Alexandre, também está apaixonado por ela. Ele desenvolve uma procura obsessiva (no melhor dos sentidos) por Véronique, a ponto de mandar uma fita de áudio para ela, só com sons ambientes. Ela consegue descobrir onde seu amado a espera apenas pela decifração desses sons.

Após o encontro definitivo dos dois, eles assumem um relacionamento. Alexandre acha fotos que Véronique havia tirado algum tempo antes. Descobre nelas, a imagem de Weronika (uma foto tirada acidentalmente naquele encontro furtivo, e que tinha passado despercebida). Agora nossa protagonista entende melhor o sentimento de não estar só, e chora.

Alexandre decide criar um espetáculo de bonecos para sua amada, cuja estória é a seguinte: há duas mulheres que nasceram no mesmo dia, porém em lugares diferentes, Uma coloca a mão no fogo e se queima. Dias depois, a outra aproxima sua mão do fogão, mas a afasta, pois tinha aprendido que o fogo queima, mesmo sem ter tido aquela experiência. Elas têm uma estranha ligação.

A fotografia foi feita pelo mesmo fotógrafo de “A Liberdade é Azul”. Ele produz cenas maravilhosas, como a vista da janela do trem sendo vista de cabeça para baixo por uma bolinha transparente.

A música exerce um papel fundamental. É uma película, acima de tudo, muito sonora.

Neste filme, mais uma vez voltamos a um lugar comum na carreira de Kieslowski: o acaso. O fato de duas mulheres que nunca se conheceram poderem se afetar tanto. Ambas têm muito em comum: nasceram no mesmo dia, tem problemas no coração, tem lábios ressecados, cantam muito bem, tocam piano, possuem uma bolinha-perereca transparente com a qual brincam como crianças, passam uma aliança de ouro nos olhos por causa de terçol, entre outros. Véronique chega a sonhar com um desenho que estava dependurado no quarto de Weronika.

Segundo o diretor, todos nós somos ligados por fios invisíveis. Qualquer decisão que tomemos pode afetar outras pessoas, quer as conheçamos ou não. Para ele, viver bem é viver com a plena noção dessa enorme responsabilidade, ou seja, viver com cuidado, para que nossas atitudes não afetem o bem-estar dos outros. Isso é mostrado por traços característicos das personagens desenvolvidos por Kieslowski, como o hábito de Weronika encostar o rosto no vidro para se refrescar. Se isso não acontecesse, ela não veria uma velha mulher pela janela, carregando duas sacolas e, conseqüentemente, não associaríamos essa cena à outra muito parecida, que nos demonstra que, mesmo sendo muito semelhantes, as protagonistas não são iguais e têm diferentes posições perante a vida. Só assim (a partir dos detalhes), descobrimos seus verdadeiros anseios (e talvez os nossos também): o porquê delas correrem, amarem, chorarem e morrerem (esta última no caso de Weronika).

Para mim, é um filme sobre a natureza humana e a delicadeza das relações. De como somos vulneráveis e de como determinamos, não só o nosso próprio destino, mas como a vida de muitas pessoas que nos rodeiam.



Nenhum comentário: