quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

Kieslowski - Morto que te quero Vivo

Krzysztof Kieslowski foi um diretor polonês que encantou o mundo com seu cinema. Nascido em Varsóvia, começou filmando documentários para depois passar para a ficção. Sua contribuição para a história da sétima arte não se limita à produção de bons filmes. A cinematografia polonesa ganhou o mundo, não só pela genialidade de seus roteiros, como pela perspectiva de um diferente conceito de linguagem. Com Krzrsztof, o cinema viu emergir, ainda mais madura, uma linguagem que criava uma identidade para o audio-visual polonês.

Sua engenhosidade se encontra na forma como ele discute a condição humana, em temas que dizem respeito a todos nós, e nos tocam por isso. Kieslowski sempre dirigiu filmes dignos de atenção, como “Sorte Cega” e “Sem Fim” na década de oitenta, mas este texto se concentrará na fase pós-Decálogo de sua carreira, que foi quando seu nome ficou conhecido no mundo inteiro pela ambição, qualidade e ousadia.

No final da década de 80, Kieslowski realizava uma de suas mais ambiciosas obras: O Decálogo. Trata-se de uma série de dez filmes de cinqüenta minutos feita para a televisão polonesa. Krzysztof transporta os valores contidos nos dez mandamentos e desenvolve uma profundíssima reflexão sobre como estão esses valores nos dias de hoje e como podemos retratá-los. A obra se tornou tão famosa e tão requisitada que o diretor transformou dois de seus episódios em longas metragens: “Não Cometerás Adultério” se tornou “Não Amarás” e “Não Matarás” manteve seu título. Ambos foram enviados para o Festival de Cannes, onde receberam o Prêmio do Júri.

Nessa altura, a forma de Krzysztof filmar seus roteiros mudou. Ele passou a minimizar os diálogos e se concentrar no poder da imagem e das cores. A preparação dos atores era algo muito intenso, pois seu papel era fundamental. Famoso por ser extremamente detalhista e econômico, o diretor se preocupava em escolher minuciosamente os lugares de todos os objetos no cenário. Filmava cada plano apenas duas ou três vezes, pois dizia que, se não havia ficado bom até então, não ficaria jamais.

Devido ao grande sucesso d’O Decálogo, Kieslowski foi chamado para trabalhar na França, onde permaneceria até seu último filme. O primeiro filme dessa “parceria” foi “A Dupla Vida de Véronique”(vide crítica homóloga), seguido pela consagrada “Trilogia das Cores” (vide “A Liberdade é Azul”, A Igualdade é Branca” e “A Fraternidade é Vermelha”), sua última obra.

Nessa fase final, os temas que mais se fazem presentes são o acaso e os “fios invisíveis que ligam as pessoas”. Vemos Kieslowski discorrer durante todo o tempo sobre a falta de controle que temos sobre a nossa vida. Podemos ser determinantes no nosso destino, mas muito mais determinantes são as pessoas que nos cercam, a nossa sorte e os acasos que acontecem na nossa vida. Seu cinema é infinitamente rico e encanta pelas fotografias e trilhas sonoras espetaculares. Talvez ele ainda nos toque pela universalidade e atualidade dos seus temas: solidão, incomunicabilidade, política, amor, entre outros (algo que nos faz cogitar uma relação entre ele, Bergman e Antonioni).

Kieslowski dizia que não acreditava no cinema, que só o fazia por ser a única coisa que sabia fazer no mundo, mas que acreditava piamente nos seus espectadores. Morreu em 1996 após concluir “A Fraternidade é Vermelha”, levado à Cannes para concorrer à Palma de Ouro, porém desbancado por “Pulp Fiction”. Tempo depois, Quentin Tarantino deu uma entrevista dizendo que o “Vermelho” é que deveria ter sido o vencedor, o que concordo inteiramente. Pouco antes de morrer Krzysztof disse, numa coletiva em Cannes que pararia de filmar (já que conhecia a grande fama dos críticos franceses de ascender um cineasta para depois derrubá-lo), mas logo depois iniciou o roteiro de uma trilogia baseada na “Divina Comédia”, que não pode concluir, mas que foi parcialmente filmada uma década mais tarde.

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